40 anos depois, no balanço dos defeitos e virtudes, erros e progressos, pode-se dizer que o Poder Autárquico foi uma das importantes victórias do 25 de Abril plasmada na Constituição*. Mas também se pode constatar que muito há a fazer no aprofundamento das actuais competências, na exigência de autarcas habilitados e com visão de futuro, ligados à terra e às suas gentes, e ainda no derrubar das barreiras que impedem o exercício pleno da cidadania por parte dos eleitores.

As actuais competências das autarquias, só serão substanciais se estiverem imbuídas de uma visão dinâmica, estruturada, entre outros, nos seguintes eixos: no ordenamento do território e da humanização dos espaços habitados, designadamente urbanos;  na implementação de uma rede de cuidados de saúde, no sentido horizontal e vertical (desde as Unidades de Saúde Familiar até a um Hospital) que sirva todos os habitantes e não só alguns; na defesa da memória colectiva na herança da paisagens, natural e edificada, requalificando em função das pessoas, e dos seus laços com os sítios;   na resolução articulada, não no fogacho de um remendo, do estrangulamento das acessibilidades e na rede de transportes públicos que sirva todo o território; na preservação, com vida enraizada, não apenas a sazonal, dos núcleos históricos evitando que a euforia estatística do turismo descaracterize e formate o que é singular ; no definir, estruturadamente, de orientações contra a exclusão social e a marginalidade; no investimento na educação e na cultura e nos agentes que a promovem, não caindo na tentação da municipalização cultural, que absorve mais recursos, financeiros e humanos, e não promove o empenho da comunidade e a continuidade da oferta.

No entanto, estes objectivos, para serem concretizados, exigem autarcas competentes e não autarcas em que a competência é directamente proporcional à influência que têm nos directórios partidários. O cartão do partido, por si, não unge de sabedoria o seu portador, muitas vezes, pelo contrário, é uma forma de disfarçar a incompetência e premiar os medíocres, os servis para com os poderes, discricionários e egoístas dos “aparelhos”. A gestão paroquial e /ou de cacique(s) ou de “personalidades em comissão de serviço” que nada têm a ver – nem querem ter – com os concelhos para onde foram indicados, tem de ser combatida pela exigência de eleitos, competentes, conhecedores da terra e das suas gentes, que deem garantias de implantar políticas activas, ao serviço da população durante todo o mandato, e não só no último ano do mesmo em manobras descaradamente eleitoralistas.

Mas a substanciação deste aprofundamento do Poder Local, só será possível se os eleitores não comprarem gato por lebre e escrutinarem profundamente programas e candidatos**. A qualidade do governo autárquico depende cada vez mais do envolvimento dos cidadãos, tanto no acto de votar como depois, exigindo uma democracia participativa que preserve os seus direitos de cidadania – ao contrário dos velhos hábitos que alguns eleitos tudo fazem para impedir, ficando assim com o caminho aberto para seguirem caminhos diferentes dos prometidos durante a campanha eleitoral e que nada têm a ver com o bem-estar da população. As populações têm de se rever na progressiva evolução do modelo de governação, contestar e barre se necessário for, desvios ao resultado do sufrágio, garantindo a sua constante e necessária participação democrática.

 

João de Mello Alvim                https://tresparagrafossegundaedicao.wordpress.com

 

 

*Nunca é por demais lembrar, que Basílio Horta foi um dos poucos deputados que votou contra a Constituição que passou a consagrar o Poder Local democrático. Não sei algum dos indefectíveis do actual Presidente, acha que o tempo lhe veio dar razão ao então deputado do CDS…

 

**Cada vez mais considero mais um exercício de transparência e um contributo para a eleição dos melhores, a possibilidade de os eleitores puderem pronunciar-se, antes do acto eleitoral, sobre os candidatos que os partidos pensam apresentar, de forma a que estes, com humildade democrática, possam recolher mais dados para confirmar ou questionar, se for o caso, as listas.